terça-feira, agosto 29, 2006

Destino


"tenho tanta palavra meiga,
conheço vozes de bichos,
sei os beijos mais violentos"
(C. D. de Andrade)


Aindo guardo em mim o amor inteiro que dei, porque ele sempre aumenta, sempre mais, água corrente que se confunde e se perde em frestas, areias, em universos distantes, em busca do seu amor.

Se me pergunta por mim, o que direi a não ser que sem você, sou heroína de romance, fenescida antes da hora, morta de amor sem encontrá-lo, virgem que enlouquece entre paredes de solidão?

Fui à cigana, mas minhas mãos estão nuas e nenhum milagre guardam de sua vinda. Nelas, só os restos de uns carinhos tristes, sem destino, como se viessem de dedos cortados. Onde está meu destino?

Nada sabia de tormentos, até acordar ao seu lado e sentir que algo se desmanchava em minha alma e essa vontade de tocá-lo, por séculos e séculos, amém que ainda hoje agita meus braços.

Nada sabia de tormentas e você, Posseidon, lançou seus ventos e seu sal em meus seios, para sempre confundidos, à mercê deste amor, sem ano novo, sem dia, sem noite.

Verteu-se inteiro, o meu amor e, no entanto, permanece. Com ele, o pudor que apenas os sozinhos conhecem.

Imagem: Pietro Antonio Rotari

domingo, agosto 27, 2006

Não morri...

Um dia, amor imprescindível e no outro, adeus.
Às vezes, porto e depois escolhos.
Foi isso o que fez comigo.
Ninou minhas noites com suas mãos de ternura e me deixou, deixando em mim uma saudade esquisita, tempestade que carrega qualquer razão que eu ainda tivesse.

Você se foi, às duas da tarde e eu não morri. Ao contrário saí pelas ruas , comprando flores, comprando cores para tingir a solidão e chorar nos seus aromas.

Não morri de sua ausência nem aconteceu nada. Tudo está igual no mundo.
Só os meus dias aumentaram e levo para dento do quarto o desconsolo das horas, os dias e noites lentas, infindáveis.
Levo as algemas do meu amor-carrasco, rio que não seca.

quarta-feira, agosto 23, 2006

Palavras toscas

Que resposta há para a vida a não ser o amor?
Adianta buscá-lo ou o amor bate à porta?
Meus olhos preferem se perder em buscas a se fechar em espera.
O amor se busca? Ouro, diamante e pedras. Pólen e pés que se beija em arrebatamentos?
O amor é dúvida, sempre dúvida para quem não recebe um aceno, um beijo ou música entre os dias.
Tanto me fascino com sonhos que, como a estrela polar de Vinícius, "enjeitada pelo frio", busco calor e procuro ninho, sinos e alguma maneira de amar.
Invento fomes e cios e sem nenhuma desesperança, me desmanho nessas palavras. Toscas palavras.

domingo, agosto 20, 2006

Mágico

Entreguei-me sim.
Entreguei meu sonhos e umas carícias secretas porque ele é um feiticeiro e me encheu de encantos.
Entreguei minhas manhãs em quase-penumbras sonolentas.
Tanto mar, salinas e sussurros. Tanto amar.
Entreguei os dias e as madrugadas, em sono, em sonho, em palavras desconhecidas para quem não ama.
Entreguei meus dramas. Os segredos não são mais.
Entreguei-me sim.
Entreguei meus vinhos, meus sabores e os beijos.
Minhas lágrimas molharam seu peito e seus olhos.
Mágico, guardou-me em sua caixa de ilusão,
entre flores, lenços coloridos e chuva de estrelas.

sexta-feira, agosto 18, 2006

INFÂNCIA


Meu amigo, quero lhe falar de cismas e, caso seu tempo permita, eu lhe conto uma história.
Pode ser de amor, quiçá de dor.
Eu era criança e fui feliz.
O quintal, as mangueiras.
Tica, Dona, Neve, galinhas irônicas, imortais mesmo depois de farturas de almoços e festas.
A lua mais bonita do alpendre de ladrilhos, disputando a atenção com “Espumas Flutuantes”.
Meu berço, Passárgada para sempre perdida!
Berço imenso, ainda hoje.
Quintal, manga, rosa branca, goiaba, jabuticaba, jaca e cisterna.
Lagarta, os cachorros Javali e Chuvisco e o mistério de seus nomes, jamais revelado.
Medo do fim do mundo.
E se o mundo acabar e levar os pintinhos?
Janelas imensas sempre fechadas, de quartos escuros, salas mortas e móveis negros, silenciosos.
Cristaleira de tesouros e o olhar faminto daqueles reflexos.
Porcelanas intocáveis à espera de sérias e raras estrelas que nem brilhavam tanto ao chegar.
Suas tristezas, suas roupas e sorrisos soturnos apagavam as cores que as luzes desenhavam em cristais adormecidos de tédio.
Só a música acordava sonhos de princesas em salões felizes e desfaziam a realidade.
Desculpe, amigo. A história se alonga e se espalha em minhas lembranças.
A vida daqueles dias permanece hoje na saudade boba deste meu coração que insiste em lembrar.

Imagem: Arthur J. Elsley

terça-feira, agosto 15, 2006

Não o amo mais

Eu queria dizer que não o amo mais.
Dizer que guardei suas lembranças
no baú dos perdidos amores.

Mas, em meu corpo, pedaços seus teimam, queimam, insistem nesta permanência vazia, nesta dilacerante ausência.

Eu preciso dizer que não o amo e me lançar de vez, no mar dos desamados, entre tempestades e calmarias abissais de dor e saudade.

Quero me desatar e deixá-lo finalmente
ir-se de mim e dos meus desejos.
Mas, meu amor, como apagar seu cheiro e esse langor que me toma
ao recordar seus beijos, arco de delícias em minha boca?

Imagem: Rodin

segunda-feira, agosto 14, 2006

UM PRESENTE...IMENSO!


Sempre compartilho com meus amigos do blog, os presentes que recebo, já é um hábito.
Eu adoro presentes, já comentei aqui. Todos são tão especiais e lindos que fico voltando neles sempre para me reabastecer de carinhos e das belezas que cada um traz. E sempre me emociono.
Ontem, recebi outro presente. Imenso presente. Mal cabe em minha emoção. Estou nuvem, inundada e prestes a se derramar.

Devo ao meu amigo Altino, ter conhecido o Sérgio que escreveu essa maravilha de presente:

só Saramar, para sarar rios, florestas,vales,montanhas e savanas.
com uma doçura só vista em novela, ou de vez em quando no cinema.
flor madura. misto de alcaçuz e açussena.
sei que Saramar é plena.
restia de luz de sol querendo se por.
Saramar é poesia, sem precisar de métrica ou de rima.
Saramar, é fonte a exalar essências de humanidade.
é nota musical a navegar pelos bordões
e primas... por sustenidas emoções!!!
Saramar é campo, é cidade.
é coral, é "coralina". é mãe, é pai é menina.
lamparina, nas solitárias e escuras noites amazônicas.
Sérgio Souto

domingo, agosto 13, 2006

PAI!

Não sou forte como pensas.
Ajuda-me!
Não sou tão corajoso como queres.
Ensina-me!
Não sou grande como tu.
Espera-me!
Dá-me a tua fortaleza,
espelhada na mão que me sustenta...
A tua coragem, provada, dia a dia,
na tua luta para que eu viva melhor...
A tua grandeza,
presente na dedicação que existia
à espera da minha chegada,
e que existe na continuação do amor feito mensagem,
até que eu chegue no limiar do exemplo que me dás!
E, cada dia, deixa-me ser o filho forte,
o filho corajoso,
o filho grande,
pelo amor com que prepara as homenagens que mereces!
(DESCONHEÇO O AUTOR)

P.S. do post: Ainda não consigo falar sobre o dia dos pais, mas encorajada pelas palavras do meu querido Marco, busquei essa mensagem para homenagear os pais que visitam o blog.
Parabéns a todos vocês.
Que Deus os abençoe para que continuem sendo exemplo, luz e árvore para seus filhos.

sexta-feira, agosto 11, 2006

Boneca sem braços

Quando me canso de sonhar com o amor, de esperar que chegue logo, finjo que vou viver traquilamente e tento me convencer que esse vazio pode ser suportável.
Como boneca sem braços de criança pobre, engano-me em dias e noites sem esperanças, com uma falsa tranquilidade de transe.
O amor, esse daimon que me assombra sem ser, este braço que falta em meu corpo, lança seus eflúvios de seda, sem nunca me tocar. Acena-me de longe, parecendo brincar o jogo cruel de um clown desalmado.
Mas, qual criança atraída por suas cores, eu o persigo pelos caminhos que vou traçando solitariamente em minha vida, acreditando que, um dia, irei alcançá-lo e apagar a escuridão que me habita.

Imagem: Marie M. Sechtlové

terça-feira, agosto 08, 2006

LAMENTO

Contemplo a distância sempre maior
entre o seu coração e o meu.
Contemplo a ausência,
plena dos erros repetidos
e das dores
que marcaram nossos dias como fogo.
Então, choro todas as lágrimas da solidão.
Tento encontrar seus rumos,
mas nossas correntes são paralelas.
Cego da mais crua das indiferenças,
você passa ao largo do meu amor,
sempre na calçada oposta.
Sempre dia quando sou noite.
Você que era meu sol, se foi,
deixando-ne na escuridão.

domingo, agosto 06, 2006

FIAPOS

Têm razão os que dizem que sou nuvem e,
ao menor vento contrário,
vou-me e me desafaço em pedaços.
Sim, sou mesmo.
Cansei-me das dores, tantas que foram
e que desenharam este meu rosto triste.
Deixei-as todas.
Hoje quero música, leite e vinho inundando-me
em noites de sonho e loucura.
Hoje quero "bagunça no meu coração",
torpor, risos incontidos e carícias levemente cruéis.
Sonho?
Sim, sonhos que recolhem meus fiapos
para que outros ventos os desmanchem.
Nuvem, sou nuvem.
Refaço-me e me desmancho infinitamente.

Imagem: Marck Rothko

quinta-feira, agosto 03, 2006

Para sempre


Na madrugada, meus olhos na janela tateando sombras, buscam você e encontram a solidão da rua deserta e nua.
Quase ouço o som de passos na mesma esquina que o levou de mim.
Aindo o imagino ave migrante de retorno certo, em canto de chegada, mas tantos verões já vieram e vieram sós.
Seus sóis entram pela casa, mas não ressuscitam as flores e os espelhos não se acendem.
O pássaro se foi para sempre. Outras primaveras, outras esquinas.
Aqui, o inverno.

Imagem: Picasso