segunda-feira, abril 30, 2007

Ilusão

Sim, amigo. Fui amada.
E, a tal altura me elevou o amor,
que vivia atordoada e me quis anjo.
Andei por nuvens,
deusa em firmamento de amantes.
Fechada em fantasia de violinos, outonos e aconchego de invernos, acreditei em todas palavras de amor que me adornavam, flores diariamente ofertadas, como beijos.
E o amor estava nas versos, em objetos, gavetas, em música
e no olhar dos meus bichos.
Mas eram asas emprestadas
e as julguei minhas
até perceber a nudez dos meus pés queimando
na terra vazia de deuses e flores.
(era um sonhar juntos;
agora, é minha boca aflita,
meu sonâmbulo corpo
e alguma ferida que dói sem descanso).


Imagem: Elvira Amrhein

sábado, abril 28, 2007

Desde que chegou

Desde que chegou,
ando por encruzilhadas de silêncio,
pois desconhecia esse subterrâneo
anunciar de desejos,
essa eclosão de me emudecer.
Se minha voz se cala,
desde que chegou,
em perfumes de cortesã me desvendo,
entrego os seios, beijo-lhe as mãos.
Se em silêncio me entrego,
é pelo temor de perturbar
os tênues acordes
deste fragílimo amor.
Se me toma em maciez de pétalas,
é que a você me entrego como as rosas,
em lento, perfumado e profundo revelar-se.

(asas leves, largífluo querer... eu e você).


Imagem: Harold Feinstein

quarta-feira, abril 25, 2007

Definição

Quis ter a beleza das deusas, a pureza,
a voz de embalar ou algum outro feitiço,
um jeito de encantar.
Nada disso tenho ou sou.
Tenho as luas que me acompanham desde madrugadas antigas demais para me lembrar.
Tenho as rugas e as cismas dos meus inúmeros dias e palavras perdidas, quase sempre de amor.
Tenho umas tantas ilusões que nunca se vão nem envelhecem.
E um amor sem rumo, sem jeito de se entregar, aqui guardado,
que às vezes emudece, mas sempre consegue
por a boca no mundo e alma nos dedos.
Então, finjo que sou poeta, brinco de atriz
e troco palavras e máscaras, ilusões.
Tento ser feliz.

Imagem: Klimt

terça-feira, abril 24, 2007

Amor despedaçado



Perdido o amor, vou aos poucos recolhendo
os pedaços de ilusões,
descartando flores mortas,
apagando palavras do meu cansaço de sonhar.
Incorrigível, apego-me a pequenos brilhos daqui e dali, paixão e caminhos que teimavam em se construir
(eu imaginei de pedra, o que era areia).
O amor é arma letal e os iludidos, amando,
nem sabem que os beijos são cordas
ou de mãos que podem sufocar.
O mortal do amor, sem volta, sem ressurreição,
é quando se vai como quem não quer,
sorrateiro deixar de ser,
é ir-se como um sonho de lento acordar,
despertando, quando nem sei se ainda durmo
ou se é o fim que invade a realidade.

E me agarro ao travesseiro como se nele estivesse ainda
tudo que minha alma guardou.
E é apenas, pena,
penas do travesseiro rasgado de lágrimas,
em vôo breve pelo meu quarto vazio.
Perdido o amor, é o que resta,
esta ilusão de pássaro que nunca chegou a voar.

domingo, abril 22, 2007

MEU ANJO

Mandas-me não amar, eu ardo
Dizes-me que sossegue, eu peno, eu morro"
Bocage


Já fui mulher de cantos e alegrias fáceis,
imersa na felicidade de uma vida comum e rasa.
Já provei vinhos e bocas levada pela beleza
e o rumor das noites vazias de solidão.
Já falei de amor sem saber
dos seus significados e armadilhas,
luzeiros de ofuscar a razão e descartar certezas.
Já fui infeliz e não sabia,
paródia triste do cancioneiro.
Agora, apesar do outono, ouso renascer,
presa nas asas de um anjo, aprendiz da ciência de voar.
Um anjo a me ensinar que mesmo as dores têm beleza,
se resultam desse amor verdadeiro que plantou em mim,
jardineiro de sonhos.
Agora, é outono.
Semeada de amor, guardo em mim
as afoitas fontes de real felicidade
que mal suportam esperar as flores
e já se querem soltas em beijos, em risos,
em luzes de primavera ou quenturas de verão.
Sou a mesma e meu amor transborda.

(Foi o anjo que, em mim, desconcertou as estações).


Imagem: Boueges

sexta-feira, abril 20, 2007

Blogs que me fazem pensar

Há pessoas que nascem viradas para a lua, todos sabem disso. Eu sou uma delas. Não, não é vaidade fútil. É uma certeza. E digo isso porque sou riquíssima. Minha fortuna é imensa e posso gastá-la sem parar, que nunca acaba. Ao contrário. Eu a espalho e ela volta, sempre.

Minha fortuna é a amizade. E, por ela, recebi este belo presente de dois amigos, ao mesmo tempo. Meu exagerado e querido amigo, Ricardo, o Poeta, de A Cor da Letra e minha doce e linda amiga, a Poeta Angela, do Esboço, com linda homenagem em forma de belas palavras, gostam deste bloguinho porque ele os faz pensar.

É um presente e uma responsabilidade. Terei que melhorar muito mesmo para atender as expectativas desses anjos que se fingem de gente.

Eu vou dizer: não há nada mais difícil que escolher cinco blogs que fazem pensar. Há dias, estou pensando (risos) e sempre há mais de 30 (ai, ai). Depois de fazer listas intermináveis e riscar daqui e incluir dali, rasgar tudo e recomeçar, cheguei nesta lista.

A melhor, a maior, a mais cultuada, a mais gentil e que ensina, encanta, diverte e se indigna com elegância impar: minha amiga (com muita honra): Santa, e o seu Blog da Santa, que já recebeu mais de 200 mil visitas (sim, isso mesmo). É o primeiro que leio todas as manhãs.

O blog do meu amigo DO, o Ramsés Séc. XXI também é referência em diversidade, inteligência e um certo lirismo meio escondido entre textos e críticas sempre importantes. Eu o leio todos os dias também.

Esse agora é até redundância. Trata-se do Antigas Ternuras, do querido Marco. Este é um repositório de lembranças, às vezes cômicas e sempre emocionantes, sem contar que ele é um maravilhoso contador de histórias, que nos prende e nos fazer desejar que nunca se acabem. Eu adoro esse blog.

Ah! O blog da Cilene (um site, na verdade), Distant Daily é jornalístico e divulga textos rápidos e interessantíssimos diretamente da Noruega. Está sempre atualizado, com matérias muito originais. A Cilene também faz um excelente trabalho sobre a vida de imigrantes brasileiros no exterior, com entrevistas e esclarecimentos importantes a respeito do sonho de "fazer a vida lá fora". Eu recomendo a leitura diária.

Falando de qualidade, beleza, reflexão e emoção, vocês precisam ver o blog da Dora, o lindíssimo Pretensos Colóquios. Neste blog, os poemas são como água de cachoeira infinita, ora leves, ora abundantes. Sempre nos encharcando de beleza e sensibilidade. É maravilhoso.

Como fui indicada por DOIS amigos, creio que posso abusar um pouco para indicar mais um lindíssimo blog, o Red Grine & Blue, do meu amigo, Poeta e fotógrafo português mais que perfeito, AntonioR. Vocês precisam conhecer a beleza das fotos, dos textos e dos poemas neste magnifíco blog.

Meus queridos, há mais outros cem blogs que eu gostaria de listar aqui, além daqueles que já estão nos links nos meus outros. Mas, fazer o quê? Só me autorizaram falar sobre cinco. É uma tarefa dificílima, mas muito interessante. Espero que gostem dos blogs que me fazem pensar.


P.S. Hoje estarei assim, linda (ai, ai, a pretensão das pessoas!).
É o casamento da minha filha. Depois, mostro umas fotos.

quarta-feira, abril 18, 2007

Carta de amor


Amor,

bem queria dizer meu, meu amor, meu, só meu, mas essas solidões a que me obriga e o silêncio onde morrem meus beijos, esses lábios selados e (rendo-me), aqueles lençóis desamarrotados não me permitem usar o possessivo pronome do amor de dois.
Já molhei as flores, o jardim está grávido de perfumes. Mas, se se demora, parte-se o jardim, esvai-se em outonos e ficam umas borboletas apenas, meio perdidas e esperançosas de alguma cor. Fico também, uma borboleta estranhamente desproporcional como é desmesurado esse amor, essa espera de você.
Tenho novidades que nem imagina: sonhos diferentes e música que inventei para cantar baixinho quando você chegar. Não, não direi mais nada. Quem sabe assim, curioso, venha em Pésago montado e eu o seduza, para sempre amante e amado?
Aprendi a desenhar mapas e vou lhe ensinar o caminho do éden (sem remorso, só os pecados).
Ninguém morreu por esses lados. Aqui, apenas desmaios de sol (como em poemas antigos) e beija-flor que parece suicida de tanto se afogar em doces águas. Mas não é nada além de felicidade.
Eu é que ando triste, dessas tristezas dramáticas que enxergam cinzas e que se querem transferir para o resto do mundo, por não se conter onde nascem.
A família vai bem e quase não há brigas. Beijos há demais, em lindo despudor, que os pequeninos andam namorando que dá gosto (e inveja também). E você é o culpado pela perdição da minha alma.
Sem mais para o momento, recuso a despedida e ouso chamá-lo: vem.

Imagem: Kilburne

domingo, abril 15, 2007

Busca

Te procurei por toda parte,
em labirintos de ausência
e caminhos siderais,
mapas rodoviários rasgados de suor e cansaço.
Te procurei, anjo e castigo
a me fazer perdida de tanto amor,
de querer.
Te procurei para que morras em mim
a me percorrer como andei pelos mundos
indo ao teu encontro
indo sempre ao teu encontro
sem saber se eras miragem,
ou romance que li e louca, comecei a viver
depois da última página.
Te procurei tanto
e agora, hesito à porta,
medrosa de não suportar
esse querer desatinado
esse quase morrer de te amar.

Imagem: Klaus Gohlke

Abrindo a semana, há um poema sobre a Terra, lá no blog do Léo.

sábado, abril 14, 2007

Reflexo (2)

O meu lado que não sei, por onde anda?
Que aparência terá?
Lagarto, cobra, flor, austo de outono ou figurante recusado na mais bela cena?
Não sei, não sei mais, dividida que vivo.
E apesar dos oceanos que me separam de mim, sei que atirar-se-ia ao escuro dos abissais amores, pois que é meu reflexo, meu contrário e minha montanha de guardados, de devaneios tontos, de flores mortas, vívidas demais.
Meu pedaço, meu obscuro interior tem as sementes de todas as flores que festejam meu desadormecer e pinta, diariamente, meu real retrato sob os disfarces que uso para empalidecer a dor de viver.

(sem você, a vida é lento veneno)

Imagem: Malhoa

sexta-feira, abril 13, 2007

BASTA UM BEIJO



Basta um beijo, um beijo só
e minha alma se abrirá em sorrisos,
em água fresca e música matinal.
Basta um beijo, um beijo só
e recolho meus retalhos perdidos,
refaço-me inteira em seus lábios.
Basta um beijo, um beijo só
e ressurjo em minhas vestes de
deusa para desnudar meus desejos.
Basta um beijo, um beijo só
e busco em baús as fantasias que guardei,
coloridas de amor para lhe entregar.
Saramar

Este é um poema antigo que reproduzo aqui, para lembrar que hoje é o dia do beijo.

quinta-feira, abril 12, 2007

Palavras


Talvez não me ouça porque
não falo a língua altaneira dos poetas.
Em minhas palavras moram a neblina,
a treva e os tons opacos da solidão.
Nada sei de amores perfeitos,
entendo apenas de mal-me-quer.

segunda-feira, abril 09, 2007

Cegueira

Tentei filosofar sobre o amor,
falar em conceitos, metafísicas, explicações.
Que bobagem. O amor é sempre único,
não se mostra em espelhos alheios.
Antes, quer horizontes onde se espalhar
e aconchego, ninar em penumbra.
Bicho livre, alteia-se em voz única e seus ecos.
Basta-se, o amor, e não se contém.
O amor não quer filosofias, nem hipóteses.
A mim, por exemplo, basta-me amar assim,
como amo você, amor impossível.

Basta esse sentir constante
que é o meu próprio respirar
mesmo sem ar, sem esperança.
Basta amar assim, como amo você, sem medo.
Basta este enredar-se de folhagens em selva, em seivas.
Cegueira de amor.

Imagem: Carol Henry

quinta-feira, abril 05, 2007

PÁSCOA

Páscoa é um estado
é não mais estar morto
é viver em si
é viver no outro.
Páscoa é liberdade
e seu traduzir:
as portas abertas,
a luz inquietante
do mais novo dos mundos
desfazendo a sombra,
onde nos escondemos.
Páscoa é tomar o rumo da vida
com a esperança dos loucos
que enxergam o sol dentro de si
e, sem saber, iluminam tudo.

Desejo a todos os meus amigos
que a vida seja
um sempre renovado iluminar-se.

FELIZ PÁSCOA!

Hoje tem um poema pequenino no blog do Leo (aquele, lindíssimo)

terça-feira, abril 03, 2007

O QUE SEI DA VIDA?


Bem disse o Poeta
que todo começo é involuntário.
E a vida é, ela mesma, a involuntária.
De repente, a vida está posta
e não é cor de rosa.
Todos os dias vão chegando,
gumes de cristal ou maciez de beijos.
De que são feitos os dias?
Será a loucura que embala os homens?
Será o amor o moto da vida?
E esse tal de futuro que de tanto esperar,
a própria vida se cansa afinal?
Eu, de mim, só sei que a vida não é espera
nem do futuro, mas a louca e permanente
certeza do seu amor que, involuntariamente
deixou cheiro de flores em minha pele
e roubou-me o sossego, a calma e a solidão.
Da minha vida, ontem, hoje e, talvez amanhã
de que nunca se sabe,
só sei amar você como amo.
De um amor com jeito de antigo e sabor
de saudade. De todas as saudades que sinto
de tanto não tê-lo.
Nada sei da vida, senão que, como disse outro Poeta,
"eu, sem você, não tenho porquê".

Imagem: Sondra Wampler

domingo, abril 01, 2007

Rio

Suas mãos são um rio.
Passam lentas e contínuas por mim.
Distraidamente, trazem lá de longe,
o limo.
E me louvam,
e lavam,
levam as feridas que julguei eternas.
Suas mãos são um rio.
Carregam flores e perfumam a dura lida
como língua de amante.
Mansas, passeiam em mim,
seu leito de se deitar.
E nas tempestades, ai meu Deus,
machucam, abrem a terra, arrancam raízes
e, violentas, invadem recônditos,
clareando tudo
chuva, rio, chuva, rio de me tomar.

Imagem: Scrmmylungsout 13

Obrigada, meus amigos, por votarem no bloguinho.
Obrigada Ricardo, a disputa foi muito boa.